Três dias para ver
O que você olharia se tivesse
apenas três dias de visão?
Helen Keller, cega e surda
desde bebê, há setenta anos, escreveu um ensaio que a revista seleções publicou
e diz mais ou menos assim:
Às vezes o meu coração anseia
por ver tudo aquilo que só conheço pelo tato.
Se eu consigo tanto prazer
com um simples toque, quanta beleza poderia ser revelada pela visão! E imaginei
o que mais gostaria de ver se pudesse enxergar, digamos, por apenas três dias.
O primeiro dia seria muito
ocupado. Eu reuniria todos os meus amigos queridos e olharia seus rostos por
muito tempo, imprimindo em minha mente as provas exteriores da beleza que existe
dentro deles. Também fixaria os olhos no rosto de um bebê, para poder ter a
visão da beleza ansiosa e inocente. E gostaria de olhar nos olhos fiéis e
confiantes de meus dois cães.
À tarde daria um longo
passeio pela floresta, contagiando meus olhos com as belezas da natureza. E
rezaria pela glória de um pôr de sol colorido. Creio que nessa noite não
conseguiria dormir.
No dia seguinte eu me
levantaria ao amanhecer para assistir ao empolgante milagre da noite se
transformando em dia. Contemplaria, assombrada, o magnífico panorama de luz com
que o sol desperta a terra adormecida.
Como gostaria de ver o
desfile do progresso do homem, visitaria os museus.
Tentaria sondar a alma do
homem por meio de sua arte. Veria então o que conheci pelo tato. Todo o
magnífico mundo da pintura me seria apresentado. A noite de meu segundo dia
seria passada no teatro ou no cinema.
No terceiro dia, a cidade
seria meu destino. Iria aos bairros pobres, às fábricas, aos parques onde as
crianças brincam. Viajaria pelo mundo visitando os bairros estrangeiros. E meus
olhos estariam sempre abertos tanto para as cenas de felicidade quanto para as
de tristeza, de modo que eu pudesse descobrir como as pessoas vivem e trabalham,
e compreendê-las melhor.
À meia-noite, uma escuridão
permanente outra vez se cerraria sobre mim.
Claro, nesses três curtos
dias eu não teria visto tudo que queria ver.
Só quando as trevas descessem
de novo é que me daria conta do quanto eu deixara de apreciar. Usem seus olhos
como se amanhã fossem perder a visão. E o mesmo se aplica aos outros sentidos.
Ouçam a música das vozes, o canto dos pássaros, os possantes acordes de uma
orquestra, como se amanhã fossem ficar surdos. Toquem cada objeto como se amanhã
perdessem o tato.
Sintam o perfume das flores,
saboreiem cada bocado, como se amanhã não mais sentissem aromas nem gostos. Usem
ao máximo todos os sentidos. Gozem de todas as facetas da beleza que o mundo
lhes revela pelos vários meios de contato fornecidos pela natureza.