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Nunca se sabe onde está uma despedida
Nunca se sabe onde está uma despedida. Até no afã do até
logo pode
esconder-se um nunca mais. Na frase infeliz, na
simples conversa, algo pode estar morrendo, do amor ou da
amizade.
Há despedidas que não são patentes. Não se lhes percebe o
estalo do afastamento, que pode estar no instante de mau
humor, na resposta infeliz, na alegria que não se repete ou
na palavra que deixamos de dar e
receber. Às vezes, está na
palavra que dizemos.
Nem sempre as pessoas se separam: esgarçam-se às vezes.
Viver esgarça. É algo que se afasta sem romper
completamente. Também no que esgarça pode haver despedida
pois, embora não haja perda de matéria, nunca mais será como
antes.
Despedir-se é sutil, nem sempre aparece. Seres em mutação,
vivemos a mudar sem saber. Na mudança, transforma-se em
recordação o que antes era união e vontade, amizade ou
convivência. Tudo faz-se retrato, álbum, caderno, poema,
carta, saudade ou memória. A despedida não é por querer:
acontece a despeito. Um simples "até já" pode conter
inimagináveis nuncas. Ou sempres.
Maravilhosa e cruel a vida! Tudo pode acontecer. As
ligações, salvo poucas, fazem-se precárias e falíveis. Nosso
destino é preso a acontecimentos semicontroláveis. Ou
impulsos, cansaços, e as discordâncias, são imprevisíveis. E
geram despedidas antes insuperáveis.
Ninguém sabe de quem se afastará. Nem quais as amizades e
amores de toda a vida, nada obstante existam. Raros captam a
dor que estala em cada hipótese de despedida. Separar-se
contém sempre a hipótese da despedida. Por isso, uma dor
sempre se infiltra em cada afastamento. Algo se assusta,
escondido em tudo o que se separa. Ainda que para ir ali
pertinho e logo voltar.
Quem viaja ameaça a despedida. "Partir é morrer um pouco".
Dizem os franceses, e com razão. Ainda que para encontrar-se
depois, quem parte arrisca despedidas. Por isso, a emoção
subjacente percorre-lhe o mistério e a "região das certezas
absolutas".
As grandes despedidas dão-se - contudo - sem que o
percebamos. As que sabemos e sofremos não são despedidas
completas, pois a saudade e a memória hão de trazer de volta
o sentimento
genuíno que agora causa dor. As grandes
despedidas infiltram-se no cotidiano e nos atos corriqueiros
de cada dia sem ser percebidas. Muitos anos depois, vamos
verificar que disfarçado em dia-a-dia ali estavam e
estalavam saudades antecipadas, vários nuncas dos quais
jamais suspeitamos. Nunca se sabe onde está uma despedida.
A não ser muito depois.
(Arthur da Távola)
www.rivalcir.com.br
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