O sol ainda não havia surgido no horizonte, quando uma mulher bateu à
porta do casebre. O Mestre meditava, enquanto Nashi, o discípulo,
despertava de seu sono.
- Entre, disse o Mestre sem abrir os olhos.
A mulher entrou, observando o interior rústico do casebre. Sentou-se ao
lado de Mahatma e disse:
- Senhor, preciso de seu socorro. Meu marido me abandonou, trocando-me por
outra mulher. Eu o amo muito e não quero vê-lo com outra. O que devo
fazer, Mestre?
Sentindo todo o sofrimento daquela mulher, o sábio abriu os olhos e
respondeu:
- Mate-o. Se ele não viver contigo, não viverá com outra.
Nashi, o discípulo, por pouco não caiu de sua cama. Jamais imaginou que
seu Mestre pudesse orientar alguém para o mal, principalmente numa
circunstância de fragilidade, como se encontrava aquela mulher.
Sentindo-se aliviada com o conselho de Mahatma, a moça concordou que esta
seria a melhor saída para não ver seu grande amor com outra mulher.
O Mestre disse:
- Vá à mata, na cachoeira da grande cascata. Lá você vai encontrar uma
planta pequena com rosas amarelas. Colha algumas folhas, ferva chá e dê
ao seu marido. Não lhe restará mais do que cinco minutos de vida.
A mulher foi-se. Seguiu rumo à cachoeira. Estava decidida a encontrar um
meio de acabar com a vida do homem que tanto amava. Ao chegar próximo à
cascata, a mulher viu uma criança de 10 anos, sentada próxima a algumas
flores, admirando o bailado de um
beija flor. A criança estava tão fascinada com o pássaro que não notou
que a moça a observava, admirada. Assim ficaram até que o beija flor
foi-se embora. Então a moça aproximou-se:
- Vejo que você gostou muito do beija-flor!
- Sim! Estou apaixonada por sua beleza. Pena que ele foi embora.
- Por que você não o pegou e o levou consigo? Estava tão próximo de
ti!
- Não dona! Não posso tirar a liberdade de uma criatura que nasceu para
ser livre, apenas para satisfazer os meus desejos. Fui feliz enquanto ele
bailou para mim e serei feliz sempre que puder lembrar da beleza de suas
cores e da graça de seu vôo. Colocá-lo numa prisão seria condená-lo
à morte. Há muita coisa bonita nesse mundo, para que eu possa ver, sem a
necessidade de sacrificar tão belo pássaro.
A moça refletiu no que acabara de ouvir. Não colheu as folhas e seguiu
para sua casa.
Naquele instante, não muito longe dali, num casebre rústico, um velho de
olhos fechados, sentindo o silêncio profundo de seu discípulo, disse:
- O amor verdadeiro é composto de amizade e sinceridade. O falso amor é
feito de amizade, sinceridade e egoísmo. Feliz é o homem que sabe
reconhecer na fraqueza do próximo o limite para o seu egoísmo. E mais
feliz será este homem se souber sentir no
egoísmo dos outros, a luz que ilumina a sua evolução.
Nashi, o discípulo não compreendeu.
Jornalista Adélio Rosa
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