Não são as más ervas que sufocam o grão é a 
negligência do cultivador.
(Confúcio

 


                              
    Oração de amor  


O sol derramava seus últimos raios de luz na pequena cabana situada à margem do Lago Azul.

Era o entardecer de vinte e quatro de dezembro.

José voltava para casa com algumas coisas compradas no mercado da cidade. O dinheiro estava curto. Meia dúzia de reais sobraram no bolso minguado do homem.

Maria, a mulher, concluíra a faxina de uma residência da cidade e voltara para casa, dedicando-se à limpeza e a preparar o natal da família.

Nunca pôde comprar um pinheirinho, muito menos um daqueles presépios ostentados nas vitrines das lojas. Mas isto não lhe tirava o ânimo. Foi ao mato, conseguiu um belo galho de pinus e, com fitas de adorno que encontrara na rua, montou a árvore dos sonhos.

Lucinha, de dois aninhos, contemplava a árvore com os olhinhos esbugalhados de fascinação. Nunca vira coisa tão bonita.

O filho Lúcio, de quatro anos, mal continha a expectativa de ver um presentinho para si debaixo daquele pinus.

A noite foi abrindo suas portas escuras e, num canto da casa, José e Maria trocavam idéias sobre o natal da família. Para o garoto, o pai usara engenho e arte e reformara um carrinho, que ficou bem legal e, para a pequena Lucinha, Maria engendrara uma boneca meio desengonçada. Também, nunca fora artista, ora.

Levaram as crianças para dormir e prepararam a velha mesa, com toalha branca, uma cuca, docinhos, suco de frutas, coisas simples do tamanho do dinheiro que tinham.

Em seguida, acordaram as crianças, que correram até a árvore natalina e cada qual pegou seu presente, com a felicidade de quem recebe uma jóia imperial.

Com a bonequinha no colo, Lucinha abraçou o pai, a mãe, o maninho e todos festejaram o nascimento de Jesus com uma estrofe do Noite Feliz. Depois, o banquete da singeleza e da alegria.

Terminada a festa, para a cama.

Lucinha adormeceu com a sua boneca colada no coração.

De repente, a boneca ganhou vida, o rostinho espraiava luz celestial, os bracinhos, redondinhos e perfeitos, se estenderam sobre a criança. Já não era boneca e sim uma amiguinha querida que transbordava amor e carinho.

Na manhã do natal, ao acordar, Lucinha contou o que acontecera.

A mãe, emocionada, pensou:
"Um coração cheio de amor, dá vida, luz e felicidade a qualquer ser, mesmo que seja uma boneca desengonçada".


Lauro Trevisan
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