Havia um homem apaixonado
por um rio, gastava longas horas vendo suas águas a passar, carregando em
seu dorso suave folhas e histórias das cidades acima e isto dava felicidade.
Sua grande alegria era quando chegava a tarde, depois do trabalho ele ia
correndo para o rio, pulava uma cerca e ficava lá em uma prainha, com os pés
mexendo nas areias grossas, bem embaixo de um velho ingá.
Falava muito, confidenciava segredos, dava gargalhadas, nunca ia embora,
enquanto houvesse luz e por muitas vezes só se deu conta que era noite
quando a lua ladrilhava de prata as águas do rio. Ficava lá, remoendo
lembranças, indo para o futuro em sonhos. Seus olhos eram rio. O rio
passeava com suas águas amigas em seus olhos, como em nenhum outro. Ambos
pareciam ter nascido para ser daquele jeito, nunca sem o outro, a unidade de
almas.
Dizia o homem:
- Amor pra toda vida.
Porém, um dia, o céu escureceu. Nuvens cobriram a terra a chuva desabou
sobre o mundo. A cabeceira do rio foi enchendo e logo tudo virou correnteza.
Árvores foram arrancadas, folhas deram lugar aos galhos pesados, estes
arranhavam tudo o que encontravam, as barrancas desmaiavam e sumiam
devoradas pela fúria das águas.O rio cresceu, ultrapassou as margens,
derrubou cercas, foi crescendo até chegar na casa do homem da história e
destruiu tudo o que encontrou.
Avançou o jardim... margaridas e rosas desapareceram, entrou porta adentro
com as mãos cheias de lama. Apagou o fogo no velho fogão a lenha, tudo ficou
destruído. Quando veio o sol, veio também a desolação. Tinha que recomeçar e
como é difícil recomeçar. Fez o que pôde, sem olhar em direção ao rio. Seu
peito era uma amargura só. Sua cabeça não ficava em silêncio. Só pensava no
que iria dizer. Então falou:
- Por quê? Por que fez isto? Eu confiava em você, tinha certeza que isto não
iria acontecer, não conosco. Havia muito amor entre nós, amor que não
merecia acabar assim. Não é só a lama que está no jardim, é a confiança que
nunca mais será confiança, o amor que nunca mais será amor, é o adeus que
será para sempre adeus... Foi inútil o rio tentar explicar. Nunca mais tarde
se encontraram. Nunca mais a lua cantou naquele lugar e as águas daquele
rio, como o coração daquele homem nunca mais foram os mesmos.
O homem mudou-se para muito longe e o rio, quando passava por lá, tentava
não olhar... mas sonhava, bem dentro, em suas águas mais profundas, um dia
ver ali, debaixo do ingá, quem nunca deveria ter ido embora...
Assim também agimos muitos de nós. Quando somos magoados, feridos ou
ofendidos por alguém que amamos, ficamos revoltados, indignados,
decepcionados com essa pessoa e não lhe damos uma segunda chance.
Viramos as costas e negamos alguma oportunidade de reconciliação. Devemos
refletir sobre essas atitudes e aprender a
perdoar mais, a amar mais!
Maktub
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