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Aprendendo
a desprender-se
Bonnie precisou ser internada
duas semanas antes do natal, para uma cirurgia, e estava muito preocupada. Além
dos quatro filhos para cuidar, ela pensava nas compras, presentes e enfeites a
providenciar.
Quando abriu os olhos depois de ter dormido grande parte dos dois dias no
hospital, após a cirurgia, olhou ao redor e viu algo semelhante a uma
floricultura.
Buquês de flores se enfileiravam sobre o parapeito da janela. Cartões se
empilhavam sobre a mesinha de cabeceira. Na prateleira, acima da pia, havia
uma dúzia de rosas vermelhas enviada por seus pais, que moravam em outro
estado.
O marido lhe disse que os amigos haviam preparado refeições para a família
e se ofereceram para cuidar das quatro crianças.
Mais flores, disse a enfermeira, entrando no quarto e interrompendo os
pensamentos da convalescente.
Ela abriu espaço entre as demais flores, para colocar outro belo arranjo
colorido.
Acho que vamos ter de mandar a senhora para casa, disse sorridente. Não temos
mais espaço aqui.
Enquanto Bonnie lia os cartões, ouviu alguém dizer: gostei das flores.
Era a companheira de quarto. Uma mulher de mais ou menos 40 anos, portadora de
síndrome de Down.
Ginger gostava de falar e não se cansava de dizer que estava ali para que o
doutor desse um jeito no seu pé. Contou que morava em companhia de outras
pessoas e desejava voltar a tempo para poder participar da festa de natal.
Enquanto Ginger foi para a cirurgia, Bonnie ficou olhando o quarto.
O seu lado
estava florido. O lado de Ginger, nada. Nenhum cartão, nenhuma flor, nenhuma
visita.
Vou oferecer a ela algumas de minhas flores, pensou.
Foi até a janela e escolheu um arranjo de flores vermelhas. Mas daí recordou
que o arranjo ficaria muito bonito em sua mesa de natal.
E as justificativas continuaram: as flores estão começando a murchar, a
amiga que ofereceu ficaria ofendida, poderia enfeitar a casa com aquele
arranjo.
Resultado: ela não conseguiu repartir nenhuma. Voltou para a cama e pensou
que no dia seguinte, quando a loja abrisse, iria pedir para que entregassem
algumas flores a Ginger.
Ginger voltou da cirurgia e uma funcionária do hospital lhe trouxe uma
guirlanda de belas flores e a pendurou acima da sua cama.
Logo após o café, na manhã seguinte, a enfermeira retornou para
dizer a
Ginger que ela iria para casa. A condução estava a caminho para buscá-la.
Ela ficou feliz pois chegaria a tempo para participar da festa de natal.
Arrumou as suas coisas enquanto Bonnie se entristeceu.
A floricultura do
hospital só iria abrir dali a duas horas.
Será que ela deveria oferecer uma das suas flores?
Ginger vestiu seu casaco, sentou-se na cadeira de rodas para ser conduzida
pela enfermeira. Quando estava na porta, pediu para voltar, como se estivesse
esquecido algo.
Foi até sua cama, apanhou a guirlanda, aproximou-se de Bonnie e,
levantando-se com certa dificuldade, a abraçou, deixando o enfeite em seu
colo.
Depois, se foi.
Enquanto ela saía do quarto, Bonnie não conseguiu dizer nada.
Segurou a pequena guirlanda nas mãos, com os olhos úmidos.
O único presente
de Ginger e ela o tinha oferecido à companheira
de quarto.
Então Bonnie entendeu que Ginger possuía muito mais coisas
do que ela mesma.
(Tudo é meu, de
Bonnie Shepherd,
do livro Histórias para o coração da mulher, de Alice Gray)
1844
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