Conta-se que, há muito tempo, um habilidoso calculista persa chamado Beremiz
Samir, prestava serviços de secretário a um poderoso Vizir. Sua capacidade de raciocínio matemático a todos causava profundo espanto. Ele era capaz de, em poucos segundos, elaborar cálculos de extrema
complexidade, resolvendo questões intrigantes.
Formulava, às vezes, sobre os acontecimentos mais banais da vida, comparações
inesperadas que denotavam grande agudeza de espírito e raro talento matemático. Sabia, também, contar histórias e narrar episódios que muito ilustravam
suas palestras, por si só atraentes e curiosas. Em função disso, a fama de Beremiz ganhou excepcional realce. Na modesta hospedaria em que vivia, os visitantes e conhecidos não perdiam a
oportunidade de lisonjeá-lo com repetidas demonstrações de simpatia e de
consideração.
Além disso, diariamente o calculista via-se obrigado a atender a dezenas de
consultas. Todos o buscavam a fim de obter as mais variadas orientações e conselhos. Beremiz os atendia sempre com paciência e bondade.
Esclarecia a alguns, dava conselhos a outros. Procurava destruir as superstições e crendices dos fracos e ignorantes,
mostrando-lhes que nenhuma relação poderá existir, pela vontade de Deus,
entre os números e as alegrias, tristezas e angústias do coração.
E procedia dessa forma, guiado por elevado sentimento de altruísmo, sem
visar lucro ou recompensa. Recusava sistematicamente o dinheiro que lhe ofereciam e quando um rico
insistia em pagar a consulta, Beremiz recebia a bolsa cheia, agradecia e mandava
distribuir integralmente a quantia entre os pobres do bairro.
Certa vez um mercador, chamado Aziz, empunhando um papel cheio de números e
contas, veio queixar-se de um sócio a quem tratava de ladrão miserável e
outros qualificativos não menos insultosos. Beremiz tentou acalmar o ânimo exaltadíssimo do homem e chamá-lo ao
caminho da mansidão. Aproximou-se e falou-lhe calmamente.
- Acautelai-vos contra os juízos arrebatados pela paixão, porque esta
desfigura muitas vezes a verdade. Aquele que olha por um vidro de cor, vê todos
os objetos da cor desse vidro: se o vidro é vermelho, tudo lhe parece rubro; se
é amarelo, vê tudo amarelado. A paixão está para nós como a cor do vidro
para os olhos. Quando alguém nos agrada, é fácil desculpar; se, ao contrário,
nos aborrece, condenamos ou interpretamos de modo desfavorável.
A seguir, examinou com paciência as contas e descobriu nelas vários enganos
que desvirtuavam os resultados. Aziz certificou-se de que havia sido injusto para com o sócio, e tão
encantado ficou com a maneira inteligente e conciliadora de Beremiz, que saiu
dali com o coração modificado. Muitas vezes o nosso ponto de vista nos permite perceber apenas uma face
deturpada da realidade.
Não é raro acreditar cegamente em equívocos, graças ao nosso orgulho
exacerbado e ao nosso velho egoísmo. Antes de adotar qualquer postura de confronto ou de sofrimento, é necessário
abandonar os "vidros coloridos" que utilizamos para ver e analisar o
mundo e as pessoas. A imparcialidade perante a vida é uma posição que devemos buscar
incansavelmente, a fim de garantir aos nossos atos, palavras e pensamentos, a
justiça que desejamos encontrar nos outros.
(Texto da Redação do Momento Espírita)