NO REINO
DAS BORBOLETAS
À beira de um charco, formosa borboleta, fulgurando ao
crepúsculo, pousou sobre um ninho de larvas e falou para
as pequenas lagartas, confusas: Não temam! Sou sua irmã
de raça!
Venho para lhes trazer esperança. Nem sempre permanecerão
coladas às ervas do pântano! Tenham calma, fortaleza e
paciência.
Esforcem-se para não sucumbir aos golpes da ventania que,
de quando em quando, varre a paisagem.
Esperem! Depois do sono que as aguarda, todas acordarão
com asas de puro veludo, refletindo o esplendor solar...
Então, não mais se arrastarão, presas ao solo úmido e
triste. Adquirirão
preciosa visão da vida, pois poderão subir muito alto e
seu alimento será
o néctar das flores...
Viajarão deslumbradas, contemplando o mundo, sob novo
prisma!
Observarão o sapo que nos persegue, castigado pela
serpente que o destrói, e verão a serpente que fascina o
sapo, fustigada pelas armas do homem. Enquanto a
mensageira fez ligeira pausa, ouviam-se exclamações
admiradas: Ah, não posso crer no que vejo!
Que misteriosa criatura! Será uma fada milagrosa?
Nada possui de comum conosco... Irradiando o suave aroma
do jardim de onde viera, a linda visitante sorriu
e continuou. Não se iludam! Não sou uma fada celeste!
Minhas asas são parte integrante da nova forma que a
natureza lhes reserva.
Ontem, eu vivia com vocês; amanhã viverão comigo!
Flutuarão no imenso espaço, em vôos sublimes em plena
luz. Libertas do lodaçal, se elevarão felizes. Conhecerão
a beleza das copas floridas e o saboroso néctar das pétalas
perfumadas.
Contemplarão a altura e a amplitude do firmamento... Logo
após, lançando carinhoso olhar à família alvoroçada,
distendeu as asas coloridas e, voando com graciosidade,
desapareceu no infinito azul. Nisso chegou ao ninho a
lagarta mais velha do grupo, que estava ausente, e,
ouvindo os comentários empolgados das companheiras
mais
jovens, ordenou irritada:
Calem-se e escutem! Tudo isso é insensatez, mentiras,
divagações...
Não nos iludamos! Nunca teremos asas! Ninguém deve
filosofar...
Somos lagartas, nada mais que lagartas.
Sejamos práticas,
no imediatismo da própria vida. Esqueçam-se de pretensos
seres alados que não existem. Precisamos simplesmente
comer e comer... Depois vem o sono, a morte...
E o nada...
Nada mais... As lagartas calaram-se, desencantadas.
Caiu a noite e, em meio à sombra, a lagarta-chefe
adormeceu,
sem despertar no outro dia. Estava
completamente imóvel.
As irmãs, preocupadas, observavam, curiosas, o fenômeno...
Depois de algum tempo, para espanto de todas, a ignorante
e descrente
orientadora surgiu como veludosa borboleta, de asas leves
e ligeiras, a
bailar no ar...
***
À semelhança da formosa borboleta que desceu às faixas
escuras onde
rastejavam suas irmãs lagartas, um dia a humanidade também
recebeu a
visita de Sublime Anjo, que veio trazer consolo e esperança.
Falou da vida abundante, que pulsa além do casulo físico.
E para provar que o que dizia é realidade, Ele próprio,
após
desvencilhar-se do corpo físico, surgiu mais livre e mais
brilhante que antes. Subiu, com a leveza de anjo alado, e
desapareceu na imensidão azul, diante de quinhentas
testemunhas, admiradas, na distante Galiléia...
E, dois milênios depois, ainda existem aqueles que
preferem acreditar que o que precisamos fazer é comer,
comer, dormir e esperar o nada... Nada mais...