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Perfume de violetas
O
crepúsculo morria no horizonte, mas transportava aos
céus a prece diária de dona Irene. Naquele dia,
porém, apesar da grande saudade, não chorava;
aprendera a transformar as lágrimas em preces e
sentia como se vozes segredassem ao seu coração o
conforto divino. Mais uma vez, ela recordava na hora
do crepúsculo...
Casara-se por amor. Uma afeição profunda, que apenas
durara cinco anos, pois o marido morrera na guerra.
Depois desse golpe, só a pequenina e loura Lucy
representava o pulsar do seu coração.
Os dias passavam, os meses e os anos. Dona Irene e a
filhinha viviam tranqüilas, mas saudosas da imagem
daquele que as deixara tão cedo. O retrato do pai
estava sempre florido com as pequeninas violetas,
que a própria Lucy colhia no seu jardim. Parecia um
querubim louro, ajoelhada em volta dos canteiros à
procura das violetas, sempre escondidas... Mas, o
perfume as denunciava.
Entretanto, dona Irene só teve esse quadro durante
dois anos; a filhinha foi para o jardim dos céus. E,
no momento em que cerrava os olhinhos azuis, ainda
pediu meigamente: - Mãezinha, eu quero levar as
violetas para o papai...
Dona Irene, embora sentindo o coração estraçalhado,
colocou nas mãozinhas de Lucy o derradeiro ramalhete
de violetas. Depois, ela ficou na saudade, envolta
no perfume das mimosas flores. As estrelas, agora,
cobrem o céu, antes azul e a tranqüilidade envolve o
coração de dona Irene, que murmura fitando o manto
estrelado:
- Jesus, por que levou meu querubim, tão cedo?
O suave perfume das violetas invadiu todo o jardim e
uma pequenina estrela cruzou o infinito. Um calafrio
passou por todo o ser extasiado da jovem senhora. E,
agora, os soluços de uma criança chegaram aos seus
ouvidos.
Agarradinha ao portão de entrada, estava uma
criança. Dona Irene passou as mãos pela fronte,
sentindo-se confusa; no entanto, erguendo-se, abriu
o portão. A criança transpôs a entrada e continuou
soluçando.
Dona Irene, erguendo a mão lentamente, passou-a
suave por aquela cabecinha, contemplando os cabelos
negros alvoroçados, olhos castanhos e um rostinho
marejado de lágrimas e pezinhos no chão... Passado o
choque emotivo, a jovem senhora, carinhosa, indaga:
- Por que chora, meu bem?
Dois olhos inocentes se ergueram, um sorriso nasceu
nos lábios trêmulos, enquanto duas lágrimas
deslizavam levemente. Uma voz infantil ressoou,
medrosa: - Minha mãezinha acaba de morrer... Eu moro
no barracão da estrada... E, antes de morrer, ela
disse que viesse pedir à senhora que olhasse por
mim. Eu tenho seis anos, estou sozinha e o meu nome
é Lucy...
Dona Irene caiu de joelhos diante da menina,
lembrando-se de sua amada filhinha; emocionada,
segurou o rostinho assustado entre as mãos trêmulas
e cobrindo-a de beijos. Elevou aos céus os olhos,
exclamando:
- Obrigada, Meu Deus! E foi então que, novamente, a
estrelinha cintilou no céu, formando um raio de luz.
Tomando a menina pela mãozinha, dirigiu-se ao
humilde barracão da estrada. E fez tudo por aquele
corpo que, ali, repousava. Numa prece fervorosa
procurou iluminar-lhe a estrada para o infinito,
enquanto na terra lhe cobria o corpo de violetas...
Depois, a morena Lucy passou a chamá-la de
"mãezinha" e, juntas, cuidavam das flores. Todas as
tardes oravam na hora do crepúsculo pelos entes
queridos, enquanto, pelo ar, o perfume suave das
violetas se misturava
Bom dia!!
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