- E lá vamos nós para uma viagem dominical! Eu disse. Uma frase que me
trouxe um monte de lembranças.
Quando eu era criança, meu pai pegava eu e minha mãe e saíamos para uma
"viagem dominical". Nunca sabíamos onde íamos parar, mas de
alguma forma sempre parecia familiar.
Eu e minha esposa saímos em nossa aventura logo depois do almoço. A
princípio as estradas eram todas por demais familiares. Viajei por elas,
a trabalho, centenas de vezes.
- Preciso de alguma aventura! Eu disse.
- Ali, tenho que descer aquela estrada! Gritei.
- Por quê? Minha esposa perguntou.
- Está chamando meu nome! Declarei.
E estava mesmo. Esta estrada. Este caminho para algum lugar... Parecia um
mapa de minha vida. As bifurcações, as curvas e pontos sem saída se
comparam aos 53 anos que eu gastei até aqui em busca de meu destino.
Então comecei a ver velhas casas abandonadas. Casas de fazenda e granjas
abandonadas durante a depressão e que ainda pontilham a campina.
- Vamos parar! Eu disse.
- Onde? Ela perguntou.
- Preciso ir ver aquela belíssima casa!
- Aquela casa velha? Ela perguntou.
- Sim. Quero tocar as pessoas que viveram aí. Eu disse.
Outra volta à minha infância. Eu adorava encontrar velhas construções
abandonadas e rebuscar o passado. Quando criança, me lembro de sentir
algo, uma força poderosa, uma conexão imediata com o passado sempre que
eu segurava algo velho em minhas mãos.
Tocar a madeira lascada e apodrecida num peitoril da janela enquanto
olhava pelo vidro quebrado desta casa deu-me um sentido das pessoas que
viveram ali.
No canto, uma cadeira quebrada. O papel de parede descascado despencando.
O sol irradiava para baixo por entre buracos do teto e criava círculos de
luz no chão expondo as pranchas nuas que formaram o lugar.
Como não havia nenhum trânsito na estrada, o vento podia ser ouvido
passando apressado pelos restos do passado.
Foi quando caí em mim.
Este é o trajeto que fiz ao longo de minha vida, a estrada na qual eu
viajei está forrada com coisas que tenho deixado para trás. Sonhos
abandonados, planos realizados e sim, pessoas que eu conheci, tudo é um
reflexo de quem eu sou hoje.
Pergunto-me agora se alguém parasse ao lado da minha estrada da vida,
eles veriam os restos de um homem feliz? Contariam às pessoas que me
conheceram e passariam a sensação de que eu fui justo, amável, bondoso,
compassivo? Ou teriam muitos contos de fracasso, dores e decepção?
Ei, mas a estrada não segue adiante? Tendo viajado até aqui quer dizer
que posso estar ainda no meio do caminho ou perto do fim. Talvez esta
viagem dominical sirva para me despertar.
A estrada adiante está cheia de curvas. Eu não posso ver todos os
cantos. Mas posso ver que o caminho está aqui sob os meus pés. E a
partir daqui posso fazer a diferença. É agora que posso tocar a vida
daqueles com quem encontro de tal forma que tenham palavras bondosas para
falarem de mim.
Então, quando minha viagem terminar, ninguém olhará em
minha vida e dirá,
"Aquela casa velha?"