Os três
fios brancos
Na residência de um certo orador sacro de grande prestígio e renome,
apareceu numa tardinha de domingo um gracioso cachorrinho preto.
A
turminha miúda da casa fez amizade imediata com o animal fujão.
Notaram
logo que na cauda do cachorro destacavam-se três fios de pêlo
bem
branquinho. tornando-o assim diferente de tantos outros cachorrinhos
da
mesma cor e tamanho que havia por ali.
Logo na semana que se seguiu, um anúncio no jornal da cidade chamou a
atenção daquele orador. Lia se o seguinte: "Quem souber do
paradeiro de um cãozinho preto, pequeno..." E, entre outras
características mencionadas no anúncio, acrescentaram: "possui três
fios de pêlo branco na cauda. Favor comunicar-se com o dono no endereço..."
O recado era bem completo e não deixava a menor dúvida.
Relatando alguns anos mais tarde esse acontecimento, o grande e notável
orador expressou com visível pesar: "Na presença dos meus filhos,
cuja personalidade estava se formando em cada um, eu separei aqueles três
fios
de pêlo branco dos demais e com uma pinça os arranquei fora.
A
obra do engano e da desonestidade parecia perfeita. Nada seria notado.
O
dono do animal, no entanto, soube do paradeiro do cachorrinho em nossa
casa e veio procurá-lo. Pertencia às suas crianças e elas o estimavam
muito. Realmente, ele conservava a grande maioria das identificações
descritas e, portanto, tinha quase tudo para ser reconhecido de imediato;
assim, o dono
já ia levá-lo, quando lhe chamei a atenção:
- Meu senhor, na publicação que fez no jornal estava destacado em
negrito o fato de que seu animal possuía três fios de pêlo branco na
cauda, não é verdade?
Diante do meu lembrete, o dono em vão tentou encontrá-los e, não os
achando, foi obrigado a deixar o cão que reconhecia ser o seu.
Esse orador, torturado pelo remorso tardio, afirmou, concluindo a narração:
"Nós ficamos com o cãozinho, mas eu perdi os meus filhos para mim
e para Deus. Eles não confiavam mais naquilo que eu ensinava em meus
sermões
ou lhes dizia particularmente.
Tudo isso porque na sua presença
não pratiquei aquilo que afirmava
estar estruturada a minha fé, isto é
a verdade e a honestidade".
Maktub
1693