Você sabe ou você
sente ?
Você já reparou o quanto as pessoas falam dos outros?
Falam de tudo.
Da moral, do comportamento, dos sentimentos, das reações,
dos medos, das imperfeições, dos erros, das criancices,
ranzinzices, chatices, mesmices, grandezas, feitos, espantos.
Sobretudo falam do comportamento.
E falam porque supõem saber.
Mas não sabem.
Porque jamais foram capazes de sentir como o outro sente.
Se sentissem não falariam.
Só pode falar da dor de perder um filho, um pai que já perdeu,
ou a mãe já ferida por tal amputação de vida.
Dou esse exemplo extremo porque ele ilustra melhor.
As pessoas falam da reação das outras e do comportamento
delas quase sempre sem jamais terem sentido o que elas sentiram.
Mas sentir o que o outro sente não significa sentir por ele.
Isso é masoquismo.
Significa perceber o que ele sente e ser suficientemente
forte para ajudá-lo exatamente pela capacidade de
não se contaminar com o que o machucou.
Se nos deixarmos contaminar (fecundar?) pelo sentimento
que o outro está sentindo, como teremos forças para
ajudá-lo?
Só quem já foi capaz de sentir os muitos sentimentos
do mundo é capaz de saber algo sobre as outras pessoas
e aceitá-las, com tolerância.
Sentir os muitos sentimentos do mundo não é ser
uma caixa de sofrimentos.
Isso é ser infeliz.
Sentir os muitos sentimentos do mundo é abrir-se a
qualquer forma de sentimento.
É analisá-los interiormente, deixar todos os sentimentos
de que somos dotados fluir sem barreiras,
sem medos, os maus, os bons, os pérfidos, os sórdidos, os
baixos, os elevados, os mais puros, os melhores, os santos.
Só quem deixou fluir sem barreiras, medos e defesas
todos os próprios sentimentos, pode sabê-los, de senti-los
no próximo.
Espere florescer a árvore do próprio sentimento.
Vivendo, aceitando as podas da realidade e se possível fecundando.
A verdade é que só sabemos o que já sentimos.
Podemos intuir, perceber, atinar; pode, até, conhecer.
as saber jamais.
Só se sabe aquilo que já se sentiu.
Arthur de Távola
1492