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A Dor alheia
Ao voltar de um exaustivo dia de caça, trazendo segura nos
dentes uma
pequena corça, a onça encontrou sua toca vazia.
Imaginando que os filhotes estivessem nas imediações, pôs-se a
procurá-los com diligência. Olhou e examinou cada canto, sem encontrá-los.
Preocupada com a demora que se tornava séria, desesperou-se e tomada
de pânico esgoelou-se em urros que encheram de espanto toda a
floresta. Uma anta decidiu indagar a respeito da ocorrência. Chegando
junto da toca, viu a onça desatinada e então, jeitosamente, procurou
saber dela sobre o que estava acontecendo.
- Devoraram-me os filhotes! - gemeu a onça. - Infames caçadores
cometeram friamente o maior de todos os crimes: mataram os meus
filhos...
A anta conciliadora, porém franca, não deixou que a oportunidade se
passasse sem que ela dissesse à onça certas verdades que embora
dolorosas, careciam ser ouvidas por ela naquele momento. Então
falou-lhe:
- Mas senhora onça, se analisar bem o fato, há de convir que suas
acusações não procedem. Perdoe-me a franqueza, nessa hora de
desespero. Respeito a sua dor, mas devo dizer-lhe que fizeram uma vez
aquilo que a senhora pratica todos os dias. Não pode negar que vive
sempre a comer os filhotes dos outros, não é verdade? Ainda agora
acabou de abater uma corçazinha...
Tomada de indignação, a onça arregalou os olhos como que espantada
pela coragem e atrevimento da anta, falando com um ódio mortal:
- Oh, estúpida criatura! É isso que você tem a dizer para consolar
o meu coração ferido pela dor? Com que direito você se atreve em
comparar os meus filhos com os filhotes dos outros? E como pode
comparar o meu sofrimento e desolação ao dos demais? É preciso
considerar primeiro a minha posição, em relação à dos outros
animais, para depois pesar a situação...
Foi nesse momento que um velho macaco, que bem do alto do seu galho
assistia ao diálogo, falou como quem está revestido de autoridade:
- Amiga onça, é sempre assim: A dor alheia só atinge aos altruístas,
mas jamais ao egoísta...
Maktub
1404 |
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