"A chave do sucesso é reservar oito horas por dia para o trabalho,
oito para dormir, e ter certeza de que não são  as mesmas."

 
 

 

 


O Bêbado e a artista

Era uma jovem artista, diferente... contava apenas quinze primaveras, mas atraía em muita gente interesse, atenção, bondade, simpatia. Sabia interpretar mensagens de alegria e enriquecer canções que o público aplaudia em palmas e ovações mas, em casa, essa jovem assume outra figura:
Parecia uma fera caprichosa! Trazia exteriormente a beleza da rosa e por dentro de si todo um arsenal de espinhos. O pai, viúvo e só, notava isso e ao ver a filha única, vaidosa, ele, humilde operário, agarrado ao serviço, começou a beber, buscando o esquecimento. 

Lamentava a viuvez, a dor, o desalento...
E, ao embriagar-se, um dia, ouviu a filha, em dura rebeldia, a expulsá-lo do lar:
- "Vá-se embora daqui - disse a filha a gritar. O senhor já não manda nesta casa, um pai bêbado é nódoa para mim.
Tolerância sempre chega ao fim...

O seu vício me arrasa, saia, saia daqui, seu lugar é na rua!". O pobre pai mal pôde levantar-se, mas ergue-se, recua, vai cambaleando na calçada, enquanto a filha tranca a porta e vai dormir mal-humorada. Seis anos transcorreram sobre a cena. A menina fizera-se famosa. No circo de alto luxo, ela domina... Parecia, no trapézio, uma estrela divina ou borboleta humana, bailando soberana.

Era a dona dos prêmios e era vista por beleza sem par e modelo de artista. Veio uma grande noite. Aplausos. Alegria. A platéia delira, a multidão aplaude, o número da moça é quase que magia. Há espanto nos olhos, êxtase nas almas... O trapézio voava, ela saltava e ria, de corpo seminu, em leve fantasia. Nisso ocorre um imprevisto.

Ante a platéia atenta, surge um curto-circuito e faísca violenta ateia fogo em cima e arrasam-se estruturas. A jovem trapezista atrapalha-se e agarra uma viga de amarra que fica nas alturas... Ela, a estrela da equipe, a moça bela e forte, grita e roga socorro, ao conhecer-se em presença da morte. O incêndio desata, o circo se esvazia, a jovem grita, grita e ninguém  a escuta; a multidão de longe apenas segue os detalhes cruéis daquela imensa luta.

Mas um velho palhaço, um canastrão de arena, vara o fogo e se eleva, em corda frágil. Eis que o povo lhe exalta a coragem serena... Certa viga, ao cair, espanca-lhe a cabeça, ele, porém, não pára e, ante a fumaça espessa, alcança a moça aflita e, tomando-a nos braços,  desce, devagarzinho, procurando caminho, nos bancos chamejantes, em pedaços...

Mas, ao depor no chão a moça linda e salva, ela sorri feliz e povo aplaude, prazenteiro. Entretanto, cai exausto o truão do picadeiro, tomba mostrando a boca, em larga flor de sangue... Era uma chaga só aquele corpo exangue. Arfa-lhe o peito enorme, a morte se aproxima.

Alguém chega e o reanima. É um velho amigo que reaparecera e que lhe arranca a máscara de cera... O povo se aglomera. Ante a cera que cai, a moça empalidece, ajoelha-se e grita, como em prece:
- "Meu Deus, ele é meu pai!" E ele nela fixando o olhar que se despede e brilha, num resto de calor e de ternura, tão-somente murmura: "Deus te abençoe, Filha do coração, meu amor, minha filha!".

(Maria Dolores)
 

 

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